O dispositivo da colonialidade de gênero no discurso transfóbico online
DOI:
https://doi.org/10.30612/raido.v13i33.9767Palavras-chave:
Violência linguística. Colonialidade de gênero. Transfobia. Indexicalidade. Entextualização.Resumo
Neste artigo, proponho a compreensão da violência linguística praticada contra pessoas trans enquanto instância do dispositivo de colonialidade de gênero vigente na sociedade brasileira. Para tanto, orientado por perspectivas pragmáticas e socioantropológicas da linguagem acerca das noções de performatividade, violência linguística, indexicalidade e entextualização, articulo construtos teóricos sobre as problemáticas da colonialidade/decolonização do mundo ocidental eurocentrado com as discussões sobre performances de gênero, vivências trans e transfobia, informadas por perspectivas queer/cuir/transviadas dos estudos das dissidências sexuais e de gênero. Do ponto de vista analítico, discuto dados gerados em uma pesquisa de cunho etnográfico virtual,realizada entre junho de 2015 e junho de 2016, na seção de comentários online do site de notícias brasileiro G1, a partir de interações acerca de matérias que tematizam a crucificação encenada pela atriz e modelo transexual Viviany Beleboni, durante a 19ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, ocorrida em 2015. Ao cabo do trabalho, argumento, grosso modo, que o dispositivo da colonialidade de gênero assenta seu horizonte simbólico em marcos de reconhecimento que significam como violentáveis, matáveis e disciplinarmente puníveis sujeitos cujas performances de gênero estão em desacordo com ontologias coloniais fundadas na alegada coerência compulsória entre sexo, gênero e desejo.
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