O Outro interno odiado: racismo e (in)segurança ontológica nos discursos da política externa brasileira
DOI:
https://doi.org/10.30612/rmufgd.v12i24.16746Palavras-chave:
Raça e Racismo, Política Externa Brasileira, Segurança Ontol´ógicaResumo
A partir de diálogos mais aprofundados entre a política externa brasileira (PEB) e lentes analíticas pós-estruturalistas (principalmente inspiradas pela psicanálise lacaniana) e pós-coloniais, bem como tendo em vista a lacuna em torno de temas de raça e racismo nos estudos da PEB, este trabalho busca posicionar a questão racial, especialmente o mito da democracia racial, como o verdadeiro alicerce das leituras da identidade brasileira, bem como dos cálculos de preferências e interesses de suas elites. Entendendo “política externa” como uma prática discursiva de construção de fronteiras, o conceito de (in)segurança ontológica é central neste artigo. Privadas do status de cidadãs, as populações negras e indígenas foram (e são) excluídas das narrativas identitárias que definem quem e para quem é o Brasil, de modo que a estabilidade da identidade do brasileiro prevê, necessariamente, a insegurança ontológica (e todas as violências que a ela acompanham) de grande parte da população que habita em seu território. Ao mesmo tempo, faz-se necessário interrogar as condições de possibilidade que permitem, de forma ambígua, que sejam sustentados discursos de Política Externa que afirmam exatamente o contrário, dando centralidade ao componente racial negro e indígena na identidade (inter)nacional do país, mascarando o encarceramento em massa e o genocídio aos quais essas populações são submetidas.
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