Arquiteturas da domesticação, arquiteturas contra a invasão

Cães ferais e paisagens reconfiguradas no cone sul (Brasil, Chile e Argentina)

Autores

  • Luisa Amador Fanaro UFSCar/ FAPESP

DOI:

https://doi.org/10.30612/nty.v9i13.15545

Palavras-chave:

Domesticidade, Paisagem, Cães ferais

Resumo

Busco, neste artigo, refletir a respeito dos denominados cães “ferais”, ou “selvagens”, a partir de seu papel ativo na construção, alteração e co-constituição de paisagens – argentinas, brasileiras e chilenas. Mobilizo, principalmente, o conceito de “arquiteturas da domesticação”, e proponho que também pensemos tais arquiteturas como infraestruturas “contra a invasão”. Se, por um lado, cercas, correntes e outros artefatos criam relações de domesticidade, por outro eles também podem vir a desvelar outras formas de interação – cercas também são sobre evitar a entrada de outrem, e, portanto, manter a divisão dentro x fora. A partir de etnografia realizada na Província da Terra do Fogo (Argentina), onde me deparei pela primeira vez com os tais dos perros salvajes, tenciono, nas páginas que se seguem, discutir e tecer conexões com outros contextos nos quais cães feralizados também tomam parte: as reservas florestais brasileiras e certas zonas rurais no Chile. Tais conexões, a meu ver, importam no sentido de que podem, quiçá, ajudar a suprimir lacunas nos estudos animais a respeito da convivência humano-animal com as tais das “espécies exóticas invasoras”, e, por conseguinte, do que estes animais estão fazendo e podem fazer. Tendo em conta que o selvagem e o feral são segmentos de um sistema de relações mais amplo, minhas intenções, aqui, são apontar para a amplitude da interação desses animais com os ambientes que co-constituem e continuamente reconfiguram com humanos e outros não humanos. Sugiro, neste artigo, que os processos de constituição de paisagens multiespécies não são somente sobre inclusão, mas, também, sobre exclusão.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

ANDERSON, David G. 2014. “Cultures of reciprocity and cultures of control in the Circumpolar North”. Journal of Northern Studies, Umeå, 8(2): 11-27.

ANDERSON, David G. et al. 2017. “Architectures of domestication: on emplacing human-animal relations in the North”. Journal of the Royal Anthropological Institute, 23: 398-418.

BECK, Alan M. 2002. The ecology of stray dogs: a study of free-ranging urban animals. Baltimore, York Press.

BENVENISTE, Émile. 1995. O vocabulário das instituições indo-europeias. Campinas: Editora da Unicamp.

BEVILAQUA, Ciméa Barbarato. 2013. “Normas jurídicas e agências não-humanas: o caso dos cães «perigosos». Avá, 19: 199-225.

BEROS, Mateo Martinic. 1982. La Tierra de los Fuegos: historia, geografía, sociedad, economía. Porvenir, Municipalidad de Porvenir.

BOITANI, Luigi; FRANCISCI, Francesco; CIUCCI, Paolo & ANDREOLI, Giorgio. 2017. “The ecology and behavior of feral dogs: a case study from central Italy”. In: SERPELL, James (ed.). The domestic dog: it’s evolution, behavior and interactions with people. New York, Cambridge University Press, p. 342-368.

BORROTO-PÁEZ, Rafael. 2009. “Invasive mammals in Cuba: an overview”. Biological Invasions, 11(10): 2279-2290.

CASSIDY, Rebecca & MULLIN, Molly (eds.). 2007. Where the wild things are now: domestication reconsidered. New York, Berg Publishers.

CROSBY, Alfred. 2011. Imperialismo ecológico: a expansão biológica da Europa, 900-1900. São Paulo, Companhia das Letras.

DESPRET, Vinciane. 2016. “O que diriam os animais se...”. Chão da Feira, 45: 1-20.

DIGARD, Jean-Pierre. 2012. “A biodiversidade doméstica, uma dimensão desconhecida da biodiversidade animal”. Anuário Antropológico, 37(2): 205-223.

DOHERTY, Tim S. et al. “The global impacts of domestic dogs on threatened vertebrates”. Biological Conservation, 210: 56-59.

DOUGLAS, Mary. 2010. Pureza e perigo. São Paulo: Perspectiva.

FANARO, Luisa Amador. 2020. “The domestic, the wild and its interstices: what can a dog do in Tierra del Fuego”. Vibrant, Florianópolis, 17, e17353.

FIJN, Natasha. 2015. “The domestic and the wild in the Mongolian horse and the takhi”. In: BEHIE, Alison M.; OXENHAM, Marc (eds.). Taxonomic Tapestries: The threads of evolutionary, behavioural and conservation research. Canberra, ANU Press, p. 279-298.

GALETTI, Mauro; SAZIMA, Ivan. 2006. “Impacto de cães ferais em um fragmento urbano de Floresta Atlântica no sudeste do Brasil”. Natureza & Conservação, 4(1): 58-63.

HRIBAL, Jason. 2003. “‘Animals are part of the working class’: a challenge to labor history”. Labor History, 44(4): 435-453.

INGOLD, Tim. 2000. The perception of the environment: essays in livelihood, dwelling and skill. London, Routledge.

LATOUR, Bruno. 1994. Jamais fomos modernos. Rio de Janeiro, Editora 34.

LEGGE, Sarah et al. 2017. “Enumerating a continental-scale threat: how many feral cats are in Australia?”. Biological Conservation, 206: 293-303.

LEIRNER, Piero C. 2012. “O Estado como fazenda de domesticação”. R@U – Revista de Antropologia da UFSCar, 4(2): 38-70.

LIEN, Marianne Elisabeth & LAW, John. 2011. “‘Emergent aliens’: on salmon, nature and their enactment”. Ethnos, 76(1): 65-87.

OSÓRIO, Andréa. 2013. “A cidade e os animais: da modernização à posse responsável”. Teoria & Sociedade, Belo Horizonte, 21(1): 143-175.

OSÓRIO, Andréa.. 2019. “Cães e gatos como espécies exóticas invasoras”. In: XIII RAM – Reunião de Antropologia do Mercosul, Porto Alegre.

PASCHOAL, Ana Maria et al. 2012. “Is the domestic dog becoming an abundant species in the Atlantic forest? A study case in southeastern Brazil. Mammalia, 76: 67-76.

PORCHER, Jocelyne & NICOD, Sophie. 2019. “Domestication and animal labour”. In: STÉPANOFF, Charles; VIGNE, Jean-Denis (eds.). Hybrid communities: biosocial approaches to domestication and other trans-species relationships. New York, Routledge, p. 251-259.

SCHIAVINI, Adrián & NARBAIZA, Carla (eds.). 2015. Conflictos derivados de las poblaciones caninas en Tierra del Fuego. Informe realizado por solicitud del Comité de Emergencia Agroganadero y de Alerta Sanitaria de Tierra del Fuego. In: https://www.researchgate.net/publication/277021246_Conflictos_derivados_de_las_poblaciones_caninas_en_Tierra_del_Fuego (acessado em 14 de agosto de 2020).

SILVA-RODRÍGUEZ, Eduardo A. et al. 2010. “Conservation and ecological implications of the use of space by chilla foxes and free-ranging dogs in a human-dominated landscape in southern Chile”. Austral Ecology, 35: 765-777.

SILVA-RODRÍGUEZ, Eduardo A.; SIEVING, Kathryn E. 2011. “Influence of care of domestic carnivores on their predation on vertebrates”. Conservation Biology , 25(4): 808-815.

SORDI, Caetano. 2015. “Guerra ao javali: invasão biológica, feralização e domesticação nos campos sulinos”. R@U – Revista de Antropologia da UFSCar, 7(1): 59-77.

SORDI, Caetano. 2017. Presenças ferais: invasão biológica, javalis asselvajados (Sus scrofa) e seus contextos no Brasil Meridional em perspectiva antropológica. Tese de doutorado em Antropologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

SORDI, Caetano. 2019: “Fences in the borderland: technique, landscape and the architectures of domestication in the Brazilian-Uruguayan Pampa”. Vibrant, Florianópolis, 16, e16600.

SRBEK-ARAUJO, Ana Carolina; CHIARELLO, Adriano G. 2008. “Domestic dogs in Atlantic forest preserves of south-eastern Brazil: a camera-trapping study on patterns of entrance and site occupancy rates”. Brazilian Journal of Biology, 68(4): 771-779.

STREET, John M.1962. “Feral animals in Hispaniola”. Geographical Review, 52(3): 400-406.

SWANSON, Heather Anne; LIEN, Marianne Elisabeth; WEEN, Gro B. (eds.). 2018. Domestication gone wild: politics and practices of multispecies relations. Durham, Duke University Press.

VASQUES, Ariane. 2016. As veredas do bode: criação na solta e laboro no sertão de Pernambuco. Dissertação de mestrado em Antropologia, Universidade Federal de São Carlos.

ZANINI, Fabian et al. s/d. Poblaciones caninas asilvestradas: impacto en la producción Pecuaria de Tierra del Fuego, Argentina. In: https://prolana.magyp.gob.ar /archivoadm/publicacions_Poblaciones%20caninas%20asilvestradas.pdf (acessado em 14 de agosto de 2020).

Downloads

Publicado

2021-06-23

Como Citar

Fanaro , L. A. (2021). Arquiteturas da domesticação, arquiteturas contra a invasão: Cães ferais e paisagens reconfiguradas no cone sul (Brasil, Chile e Argentina). Revista Ñanduty, 9(13), 152–177. https://doi.org/10.30612/nty.v9i13.15545

Edição

Seção

Dossiê - Humanos e outros que humanos em paisagens multiespecíficas