Apresentação

Apresentação

Leandro Baller
Universidade Federal da Grande Dourados, Brasil

Apresentação

Fronteiras: Revista de História, vol. 22, núm. 40, pp. 7-10, 2020

Universidade Federal da Grande Dourados

Universidade Federal da Grande Dourados 2020

Apresentação

Viver, sentir, esquecer: apostasia na trajetória de Rachel de Queiroz, artigo de autoria de Plauto Daniel Santos Alves e de Beatriz Rodrigues, apresenta reflexões sobre as múltiplas identidades e versões de si que perpassam as narrativas da escritora Rachel de Queiroz. O enfoque recai sobre as redes de sociabilidades, os afetos e os sentimentos que transpassaram e emergiram no processo de sua cisão com o Partido Comunista. Para tanto, categorias próprias ao campo da História Intelectual e aos estudos voltados à memória se fazem importantes. O texto torna possível nuançar e perceber as tensões e silêncios que perpassam tanto a identidade pueril e jovial quanto a identidade mais intelectualizada e circunscrita à maturidade da escritora. Percebe-se que a ruptura de Rachel de Queiroz com as esquerdas não possui um marco definitivo, tratando-se de um processo paulatino e difuso ocorrido entre os anos de 1935 e 1940, marcado ora por aproximações, ora por distanciamentos e composto por uma intricada rede afetiva. Assim, as tramas históricas, políticas e literárias de Rachel de Queiroz compõem um cenário complexo para suas identidades, no qual estão entrelaçados os sentimentos, os afetos, os desejos, os medos, as dores, dentre outros elementos da sensibilidade da escritora.

Gênero, corpo e colonialidade: deslocamentos epistemológicos e feminismos a margem do sul global, escrito por Flávia Pereira Machado, evidencia os elementos centrais que demarcam os feminismos latino-americanos a partir dos deslocamentos epistemológicos engendrados no Sul global em contraposição às perspectivas eurocentradas e, em especial, ao feminismo hegemônico/ocidental. Para tanto, recorre a revisão da literatura em torno da crítica à colonialidade do poder, colonialidade de gênero e colonialidade discursiva dos feminismos hegemônicos no sul a partir dos debates engendrados pelas críticas feministas decoloniais, no sentido da construção de um conhecimento situado para a produção de epistemologias feministas latino-americanas a partir das margens. O objetivo é situar teoricamente o conceito de feminismos decoloniais como categoria-ferramenta de análise.

Em texto intitulado A velhice vivida e contada pelas pessoas do Assentamento Colônia Conceição, proposto por Fábio Nunes Pereira e Alzira Salete Menegat, analisa o sentido da velhice nos relatos das pessoas com 60 anos ou mais, assentadas na Colônia Conceição, assentamento rural localizado no município de Nioaque, em Mato Grosso do Sul. Aquele lugar conta com mais de 200 pessoas vivendo a fase da velhice, envolvidas com jornadas de trabalho nos lotes, construindo projetos para permanência, acalentadas pela sociabilidade que nutrem com a vizinhança. Nos arranjos cotidianos, o trabalho é o elo principal que as mantém na terra, ligado por um conjunto de elementos que se entrelaçam entre si, configurados no pertencimento à terra, nas relações de interação entre as pessoas, no fazer do processo produtivo e nos projetos futuros. Em 128 lotes existe a presença de pessoas na fase da velhice, administrando os lotes e evidenciando resistência ao viverem no assentamento.

Andrius Estevam Noronha no artigo A industrialização de uma comunidade de imigrantes alemães no Sul do Brasil: Santa Cruz do Sul. 1849-1918 aborda a historiografia sobre o desenvolvimento econômico industrial de uma comunidade de imigrantes alemães no sul do Brasil, mais especificamente o Município de Santa Cruz do Sul, localizado a duzentos quilômetros de Porto Alegre. O recorte temporal dessa análise está situado entre os anos de 1849, ano de fundação da colônia, até 1918, contexto que a comunidade estruturou uma base econômica que permitiu um processo de industrialização local. Para entender como ocorreu esse processo faz-se, num primeiro momento, a análise historiográfica do empresariado de origem alemã no Rio Grande do Sul e, num segundo momento, a produção intelectual sobre o desenvolvimento econômico de Santa Cruz do Sul.

As dinâmicas formais/informais e modus operandi da mobilidade da população fronteiriça do sul de Angola, de Sónia Cristina Cardoso dos Santos Silva, dedica-se à caracterização da mobilidade populacional na fronteira Sul de Angola (Angola/ Namíbia), nos três períodos históricos em análise – pré-colonial, colonial e pós-colonial. Com ou sem delimitações formais da linha fronteiriça, na região encontram-se dinâmicas de mobilidade populacional, sobretudo entre as populações que habitam a zona. As dinâmicas de mobilidade caracterizam-se pela existência de mecanismos informais dos dois lados da fronteira, a que se acrescentam mecanismos formais, adotados pelos Estados, de controle dessas dinâmicas. Este texto sofreu revisões apuradas em relação ao tema e as avaliações tornaram-no extenso em seu conjunto, o Conselho Editorial observou a questão, mas entendeu que para a plena explicação previamente definida pela autora, era necessária a manutenção do texto, mesmo entendendo que ele fugisse às normas estabelecidas. Esclareço que esse é um caso atípico e que sempre optamos por seguir as normas da Revista em relação ao proposto em sua política editorial.

Ricardo Oliveira da Silva, escreve sobre Bertrand Russell: ateísmo, agnosticismo e filosofia analítica no século XX, em que apresenta o surgimento e o significado do “ateísmo público” e do “agnosticismo filosófico” do inglês Bertrand Russell (1872-1970) a partir dos textos que ele produziu particularmente na década de 1890 e de 1920. Para realizar esse objetivo, optou-se por destacar no artigo o debate historiográfico sobre a identificação do autor como ateu e agnóstico; as origens de sua descrença religiosa no cenário filosófico inglês da década de 1890 e as críticas que direcionou às doutrinas e instituições religiosas nos anos 1920; avaliações sobre o ateísmo e o agnosticismo do pensador britânico. Com base nestes pontos, evidencia a contribuição desse filósofo para a história das ideias sobre ateísmo e agnosticismo.

Presença e/ou ausência da História Quilombola no Currículo: análise dos Livros Didáticos utilizados no Ensino Médio Integrado, escrito por Diego dos Santos Alves e Beatriz Medeiros de Melo. Os(as) autores(as) contam que a partir da aprovação da Lei nº 10.639/2003, o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira passou a ser obrigatório na Educação Básica. Analisam o cumprimento dessa prerrogativa legal, identificando a presença/ausência da temática afro-brasileira e africana, na qual a história quilombola se insere, no Ensino Médio Integrado (EMI), ofertado pelo campus do Instituto Federal de Alagoas (Ifal) em Santana do Ipanema. Realizam tal intento mediante uma investigação de natureza quali-quantitativa. Desse modo, num primeiro momento, revisitam as políticas públicas educacionais destinadas à visibilização das comunidades quilombolas no âmbito da Educação Básica. Em seguida, analisam a presença/ausência do debate sobre a questão afro-brasileira e africana em livros de História aprovados no PNLD e disponibilizados ao campus Santana do Ipanema, no período de 2015 a 2020. Apresentam, ainda, a oferta de um vídeo educativo, que reconstrói as memórias de uma comunidade remanescente em Alagoas, como recurso didático que oportuniza o debate da questão quilombola no currículo do EMI. Apontam para a invisibilidade da temática e propõe a elaboração de materiais didáticos específicos que assegurem a presença da história e cultura quilombola no cotidiano escolar, a partir de um currículo antirracista.

A Fronteiras: Revista de História, traz ainda duas resenhas, respectivamente do livro de Ângelo Emílio da Silva Pêssoa, intitulado As ruínas da tradição: a Casa da Torre de Garcia d’Ávila, família e propriedade no nordeste colonial, publicado em 2017 e nesse momento resenhado por Eduardo Martins. Bem como traz a resenha do livro de José Dirceu, intitulado Zé Dirceu Memórias. Volume I, publicado no ano de 2018 e hora resenhado por Fernando Tadeu Germinatti.

Finalizando essa Edição publicamos a entrevista realizada por Marina Lis Wassmansdorf, intitulada Ditadura argentina em foco: a problemática das filhas e filhos de repressores por Teresa Basile. A entrevista traz à baila a pesquisa da professora argentina Teresa Basile que desenvolve estudos sobre a segunda geração afetada pela ditadura nos anos 70 do século XX na Argentina, a saber; as filhas e filhos de repressores argentinos que condenam os crimes praticados pelos seus pais. Basile explora o tema abordando os vínculos entre literatura, violência, política e memória, nas literaturas latino-americanas das últimas décadas. Portanto, trata de temas que nos levam a perceber as violências praticadas pelo Estado no passado recente, nos fazendo refletir sobre as permanências dessas violências no presente e nas lutas que tentam cessar essas repetições na atualidade. A professora Teresa Basile é apresentada de maneira mais intensa no conjunto da entrevista que segue publicada.

Esclareço que para a presente Edição o Conselho Editorial da Fronteiras: Revista de História optou por não organizar um dossiê temático, como costumeiramente vinha ocorrendo. Em diálogo com a equipe técnica da Editora da UFGD e do Portal Periódicos da UFGD, priorizamos nesse momento algumas demandas técnicas no interior da Revista, como a promoção de novos indexadores, bem como e em especial nesse momento a finalização dos trabalhos de publicização online na página da Revista das edições que estavam disponíveis em modo impresso. As edições impressas somam ao todo 15 números que foram publicadas em 13 edições, alguns números foram publicados em conjunto numa mesma edição. Esse trabalho compreende as publicações entre os anos de 1997 quando a primeira edição da Revista foi publicada impressa, até o ano de 2007 quando surgiu a primeira publicação online na página específica da Revista. Agradeço ao empenho de todas as pessoas nesse importante trabalho, bem como às instituições que dele demandaram nossos cuidados com as boas práticas editoriais.

Quero finalizar a Apresentação dessa edição fazendo um agradecimento especial ao Professor Dr. Fabiano Coelho, que contribui com a Fronteiras: Revista de História, com muita dedicação, sem poupar esforços, durante os últimos cinco anos e entre 2015 e 2020 foi um dos editores-chefes desse periódico, a partir de agora assume outro papel na Revista, passando ao quadro permanente do Conselho Consultivo. Obrigado, seguimos com a mesma intensidade e sempre contando com vossa parceria nessa empreitada.

Sem mais, e em nome do Conselho Editorial da Revista consternamo-nos com as centenas de milhares de vítimas da pandemia de coronavírus ou a pandemia de Covid 19, com o desejo de melhores dias à tod@s e uma excelente leitura.

Dourados, verão de 2020.

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