Formação docente em Minas Gerais: A ética docente nos preceitos da Revista de Ensino no cenário de 1925–1940
Rev. Educação e Fronteiras, Dourados, v. 12, n. esp. 1, e023011. e-ISSN:2237-258X
DOI: https://doi.org/10.30612/eduf.v12in.esp.1.17131 14
a assistência do meu amor e da minha fé. IV Honrarei a minha profissão e,
pelo estudo, identificar-me-ei com ela. V Não guardarei ressentimento para
não me tornar criminoso pelo coração. VI Respeitarei na criança a
personalidade, deixando-a ser criança, como deve. VII Com a esperança do
semeador, farei de minha escola a sementeira de minha Pátria. VIII Cultuarei
a verdade e, com meu exemplo, incutirei essa virtude no coração dos meus
discípulos. XIX O interêsse da criança, sua vida, sua felicidade serão meu
ideal, minha alegria e minha razão de existência. X Jamais serei um
mercenário, e pontificarei na escola como um altar, — porque o magistério é
um sacerdócio (REBÊLO, 1934, p. 2).
Como é conhecido, o Decálogo faz referência aos princípios éticos e de adoração do
judaísmo, o que nos remete diretamente a credos religiosos. No caso do Decálogo do professor,
cada “mandamento” contém palavras, frases e períodos que formam uma progressão que vai
desde a ideia de fé até o conceito de sacerdócio, passando pela relação entre aluno e discípulo,
professor como pontífice e escola como altar (um objeto associado à igreja e à prática religiosa).
A autoria do texto do Decálogo em si reforça a disseminação e a incutição da ética
religiosa no corpo docente em Minas Gerais. Afinal, foi elaborado e redigido por um diretor de
grupo escolar, Mario Rebêlo. Ele adotou a concepção de docência como um sacerdócio, e talvez
desejasse o mesmo para o corpo docente sob sua responsabilidade. Curiosamente, é no contexto
do professor (do autor) e não da professora que se situa o público-alvo do Decálogo. Isso fica
evidente no uso dos verbos na primeira pessoa do singular, como “amarei”, “serei”, “honrarei”,
e no uso do adjetivo masculino “solicito”.
Ainda no contexto da progressão, passamos do Decálogo para a prece: o texto intitulado
“Oração da mestra”, onde fica evidente a intenção de incutir a ética religiosa na formação de
educadores em Minas Gerais, embora o público-alvo da oração sejam as professoras. A conexão
entre docência e religião é insinuada na primeira frase: “Senhor! Tu que ensinaste, perdôa que
eu ensine e que tenha o nome de mestra, que tiveste na terra” (REVISTA DO ENSINO, 1926, p.
33). Se Deus foi um mestre e a Terra foi o lugar onde Ele ensinou, agora o movimento seria do
terreno em direção aos céus, ou seja, estabelece-se um vínculo entre o trabalho docente e o
divino. Observaremos outro trecho significativo que ilustra essa compreensão:
Dá-me que eu seja mais mãe do que as mães, para poder amar e defender,
como as mães, o que não é carne da minha carne. Dá que eu alcance fazer de
uma das minhas discípulas o meu verso perfeito [...]. Torna-me possivel o teu
Evangelho nos tempos que correm, por que eu não renunciei á batalha de cada
dia e de cada hora, em pról de seu ensinamento (REVISTA DO ENSINO,
1926, p. 33).